4.1.1. Tecnologia digital: aliada ou inimiga?

O uso de tecnologias digitais para fins de aprendizagem é um tópico que tem suscitado interesse junto de investigadores e de académicos e que está também inscrito nas agendas políticas há já algum tempo. Apesar do crescente reconhecimento dos benefícios da adoção de soluções digitais na formação, bem como do crescimento exponencial do número de aplicações e de plataformas de aprendizagem online, até muito recentemente, o uso de tecnologias digitais era muitas vezes perspetivado negativamente. Por conseguinte, o seu uso era restrito ou mesmo proibido em contexto de formação. Tais restrições encontravam sustentação nos seguintes argumentos: o uso de dispositivos e de ferramentas digitais fomenta a distração dos formandos; as tecnologias digitais encorajam o logro, tanto em contexto de formação, como na execução de tarefas escolares; o ensino através de plataformas digitais aumenta a distância e limita o contacto entre formadores e formandos, contribuindo para fomentar a desmotivação destes últimos e, assim, comprometendo o seu processo de aprendizagem; as barreiras socioeconómicas e geracionais em termos de acesso às tecnologias digitais limitam um uso mais amplo das mesmas para fins formativos. Por fim, mais recentemente, a proteção de dados e outras questões éticas somaram-se a este conjunto de argumentos, sobretudo à medida que se foi tornando cada vez mais evidente que o setor da formação não pode depender somente de plataformas digitais e de recursos de aprendizagem controlados por empresas privadas.

Pode dizer-se, todavia, que a crise pandémica suscitada pela COVID-19 contribuiu para tornar obsoleta boa parte destes argumentos. Em conformidade com o Digital Education Action Plan (2020-2027), recentemente publicado pela Comissão Europeia, a pandemia contribuiu para acelerar a transição digital no setor da formação, mas gerou também desafios e novas questões que alimentam esta discussão complexa (Comissão Europeia, 2020). Por outro lado, de acordo com o relatório Education and Training Monitor 2020, a pandemia não só destabilizou enormemente este setor, como revelou também o papel fundamental da prontidão digital dos formadores (Comissão Europeia, 2020).

Embora nem sempre dispostos e/ou preparados para utilizar e permitir o uso de tecnologias digitais em contexto de formação, os formadores demonstraram engenho, criatividade, dedicação e resiliência extraordinárias. Na verdade, quando o distanciamento social e o confinamento se tornaram obrigatórios, os formadores asseguraram uma rápida mudança para cenários de aprendizagem online (Vourikari et al., 2020). Além disso, a pandemia revelou a centralidade de que se revestem quer a formação de adultos, quer a aprendizagem ao longo da vida, pois a execução de muitas tarefas quotidianas passou a estar dependente do recurso a tecnologias digitais (UNESCO, 2020). Esta afirmação é válida tanto para formandos como para os formadores que, subitamente, se viram obrigados a um esforço contínuo de aprendizagem, para um desenvolvimento acelerado das suas competências digitais.

É impossível prever o futuro, mas, certamente, podemos aprender com o passado. Os eventos recentes revelam que as tecnologias digitais são indispensáveis nas nossas sociedades, mas também que estas podem ser ferramentas poderosas para fins de ensino e de aprendizagem. Para explorar todo o potencial das tecnologias digitais na formação é, todavia, necessário fomentar o desenvolvimento das competências digitais e da literacia digital de todos os cidadãos. É, pois, imprescindível garantir que ninguém fica para trás ou é excluído desse processo de profunda transformação.